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domingo, 7 de novembro de 2010

Réstia


Me afogo nesse céu sem estrelas e na vastidão traiçoeira do universo. Olho para o oceano interminável e penso no meu próprio continuar: esse mundo gigantesco cabe dentro de mim, não seria errado reclamá-lo se não houvessem tantas pessoas nele que também podem tê-lo dentro de si. A natureza tem sua própria democracia, onde o homem acredita interferir, quando na verdade é o mais manipulado por ela. Eu sinto meu coração doer de maneira violenta e isso me faz bem, na medida que a dor me lembra da vida. Os deuses saíram de férias e esqueceram de voltar, porque queriam ensinar aos seres humanos que eles podem fazer várias coisas sozinhos, porém, esses deuses esqueceram de colar um aviso na geladeira do universo o que deixou as pessoas insanas pela seu regresso, achando que, como um filho que sai sem avisar, esses mesmos deuses morreram no caminho. Já que a tendência do milênio é o trabalho em grupo, tenho preferido as religiões politeístas em detrimento das monoteístas. Isso tudo é insensato – não faz sentido – disse bem Eclesiastes. Voltando ao meu afogamento, tudo o que meu eu lírico está contando é algo que está dentro de quem possui o eu lírico: teóricos, não quebrem a cabeça! Tudo que o eu lírico diz é ficcional, até mesmo todas as verdades escatológicas. Penso profundamente de novo na minha dor, sinto algo talvez inconfessável, mas, nunca inconfessável para mim mesma. Nunca tive o hábito de mentir para mim, eu sempre crio situações onde eu posso tanger a verdade sem mistérios ou pudores. Simplesmente estou cansada de buscar algo que deve sair de mim: eu busco um grito quando eu é quem devo gritar e nada mais. Nós temos uma vida miserável, nosso universo é cheio de trevas e teimamos em nos apegar ao fogo como única salvação. Errados estão todos aqueles que ignoram a própria luz, pois, nesse recinto galáctico de sofrimento e desgraça, mesmo com toda bruma no caminho e mesmo com toda a escuridão, a luz não passa de uma ilusão óptica. Iluminar é mais que dar forma, é estar de olhos abertos dentro do caminho que não se enxerga, pelo simples fato que é muito diferente “estar de olhos fechado e não ver” de “estar de olhos abertos, apesar da escuridão”: não há como saber o que é trevas até tocá-la com seus próprios sentidos. A nossa geração paga e pagará muito por ignorar os sentidos, toda essa aversão ridícula a dor e ao sofrimento com essas frases medíocres de “quero ser feliz” não diz o que realmente quer se dizer: “quero uma vida ordinária, sem sofrimentos ou tristezas. Quero a vida farta, sem preocupações”. Isso tudo é tolice, quem consegue viver com essa ilusão? Pessoas tem que morrer, você também terá. Pessoas tem que discutir, você também terá. É simples, tudo isso é a vida e não se pode escapar dela nem morrendo, porque morrer também é vida. Viver não se explica, caramba, se vive e pronto. Cada dia, dia-a-dia, pelo caminho difícil que ela é e – graça aos deuses – ela existe. As pessoas tem que agradecer até pela mentira que viverem, pois, mais importante que a mentira é a vida. Sinto uma tristeza inefável quando olho para mim, tentando estupidamente mudar o mundo, quando na verdade o mundo sou eu. Sinto uma lágrima metafísica escorrer pelos meus olhos, como se meus ossos chorassem minha sincera estupidez. Há muita coisa que eu tenho que fazer e nenhuma delas inclui desistir por levar porrada da vida. “Escreve com sangue e descobre que sangue também é espírito”, diz Nietzsche em seu Zaratustra, eu digo: “Quem procura um amor, quer ser amado. Quem procura o amor, quer amar.” É simples e é assim que eu termino esse texto.

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